quarta-feira, 7 de abril de 2010

CAPÍTULO IV



O Sr. Euclides pediu licença e entrou para colocar a gravata e o paletó. Estava se aproximando a hora de ir para o trabalho. D. Maria José, que vinha participando da conversa quase só por monossílabos ou acenos de cabeça, assumiu agora o seu papel.
- Ah! Ricardo, se preocupação e tristeza matassem, eu já estaria do outro lado da vida. O que nos consola é a certeza de que nunca houve omissão de nossa parte. Temos tentado tudo, inclusive um milagre. Aliás, é a oração que nos tem sustentado. Jamais abrimos mão de nossa fé.
- O Jofre vem tendo todas as oportunidades e jogando-as fora. Ainda não percebeu o verdadeiro sentido da vida, o verdadeiro prazer de viver. Aqueles que fazem opção pela prática de esportes, pela arte, pelo contato com a natureza são mais felizes e saudáveis. Dormem cedo, estão sempre bem-dispostas, com bom rendimento também na área profissional.
E depois de uma pausa, Ricardo continuou:
- Para falar verdade, só quando era mais novo experimentei bebida. Sendo ainda mais sincero, uma vez até provei maconha, mas para nunca mais porque desde cedo percebi que meu caminho era outro: gostar da natureza, de vida ao ar livre, caminhadas, prática de esportes. Essa é a minha inclinação e também a minha opção.
- Seus pais devem ser muito felizes. Tão novo, formado em Educação Física e em Biologia e com seu próprio negócio indo muito bem! - Graças a Deus! Foi uma luta e a realização de um sonho. Sempre desejei montar uma academia e trabalhar esse lado saudável com as pessoas. Talvez por perceber, na minha geração, muita gente fumando, bebendo, usando drogas e com idéias deturpadas sobre sexualidade. Estão faltando discernimento e paz de espírito neste mundo de Deus.
- Como gostaria de que meu filho pensasse como você!
- Sempre fui preocupado com esses problemas. Procuro orientar pré-adolescentes e adolescentes sobre a importância do esporte, do exercício físico. Convivo com jovens que optam pelo esporte, cuidam do corpo, buscando uma vida mais saudável. Procuram dormir cedo e acordar cedo e estão sempre fazendo caminhadas, mergulhando. Enfim, curtindo o mundo e seus encantos. Em conseqüência, são felizes e bem ajustados na família, na escola e na sociedade.
- São hábitos saudáveis que nos garantem uma vida feliz.
- Essas pessoas se interessam pelas coisas fantásticas que a natureza oferece. Mas existem aqueles que, para eles, prazer tem de ser artificial: tomar todas, voltar de madrugada para casa, usar maconha, cocaína, xarope. Esquecem que esse tipo de prazer é ilusório, passageiro, altamente destruidor. Dá ressaca, mal-estar e atrapalha a vida da pessoa na família, no estudo, na profissão.
- Infelizmente, é uma grande verdade. Conhecemos essa experiência na carne pelo caminho que o Jofre escolheu.
- Realmente! São aqueles que não vão para frente na vida. Sempre angustiados, ansiosos. Seria tão bom se soubessem conviver bem com o meio ambiente, respeitando-o, tentando preservar a natureza, sem essa preocupação exagerada de consumo, como se o mundo fosse acabar amanhã. Precisamos despertar esse lado saudável do jovem, o lado sonhador, a vontade de melhorar o mundo, controlar os impulsos. A vida vai ter outro sabor quando voltarmos a ser românticos, mais otimistas.
- Hoje em dia, só se vê gente pessimista e o romantismo parece mesmo estar desaparecendo.
- O jovem está muito para baixo. Reclama de tudo, esquecendo que cada um de nós tem que começar, lutar e fazer primeiro por si mesmo, antes de se queixar da família, da escola, da sociedade. Boa parte deles hoje acha tudo “um saco”! Brinco com eles que essa é a síndrome do “sacocheismo”. Mas ninguém está fazendo nada para mudar.
- Felizmente, alguns fazem, como é o seu caso.
- Afinal, reclamar é fácil. Diagnosticar que o mundo está uma droga, qualquer um diagnostica. Basta ligar a TV e abrir um jornal. Mas quem é que está liderando ações de transformação, dando sua contribuição em movimentos sociais? Propondo soluções e batalhando por um mundo melhor?
- Ricardo, você esta de parabéns! Nessa hora a gente ganha mais energia, mais força. E pensa que nem tudo está perdido.
O Sr. Euclides entra na sala, apertando o nó da gravata e diz:
- Com muito pesar estou saindo. Sou ainda daqueles funcionários públicos que não atrasam e levam serviço a sério. Executo com muito amor e alegria o que faço.
- Se todo servidor público tivesse esse espírito, com certeza, teríamos um pais bem melhor. O senhor está de parabéns! Tenha paz e serenidade porque procurou formar bem a sua família. O Xará é um problema à parte. Conversaremos sempre que pudermos. Gostei muito do nosso encontro.
- O prazer foi recíproco. Você é um jovem fantástico! Aliás, eu já o conhecia de nome, pelo seu trabalho com a moçada. Bem., posso deixá-lo ai? Fico até preocupado com a reação do Jofre...
- Nós vamos ter uma conversa tranqüila. Pode ir sem nenhum receio. Já estou habituado e sei como conduzir o nosso diálogo.
- Que Deus os abençoe e os ilumine neste encontro.
- Amém! Vá com Deus! Um bom dia de trabalho para o senhor!

Livro Eduardo Aquino: Xará, o doidão: que começou na maconha e terminou no pó. 2ª Edição – Belo Horizonte/2000.

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